Gostei e não gostei de 'Tabu', de Miguel Gomes.
Apesar da Laura Soveral e da sua magnífica personagem, tudo o resto, na primeira parte do filme, parece um pouco artificial. Aqueles diálogos irreais, como que tirados de antigas e muito más peças do Nacional, aquelas pessoas quase sem expressão facial, aquelas personagens de que vamos sabendo pequenas coisas mas que nunca chegamos a conhecer verdadeiramente - sim, eu sei, isto é um filme e os filmes não têm que ser todos "naturais" mas eu não sou uma pessoa muito nouvelle vague, eu cá preciso de acreditar nas personagens e nas histórias para gostar de um filme. Preciso de atar as pontas todas, nem que seja na minha cabeça. Fico perdida. Aquela história toda da Pilar com a miúda polaca, o aeroporto, o bolo, a prenda, tantas cenas com aquilo e, ok, ficamos a saber que ela é muito religiosa e muito boazinha e muito solitária, mas depois não sabemos muito mais sobre ela, porque é que é assim tão religiosa e tão solitária. Ou a Santa, a empregada que está a aprender a ler e até a vemos numa aula, mas depois também não sabemos mais nada sobre esta alminha que só diz meia dúzia de palavra no filme todo.
Estava eu já a ficar um pouco desiludida e sem perceber como é que tinha ouvido tantos elogios e, de repente, foi como se começasse um outro filme. Na segunda parte 'Tabu' é um filme cheio de nostalgia. Uma nostalgia que se pressente nos penteados, nos bigodes, nos vestidos e nos sapatos, no grupo de baile que cantava em italiano e em inglês, nas recordações de uma fazenda em África, nos empregados submissos, na decoração colonialista das casas. Uma nostalgia que se vê nas imagens a preto e branco, naquele tremido de Super-8 e nos planos fixos que passam diante de nós como slides projetados na parede lá de casa. Uma consonância perfeita entre o conteúdo e a forma. Uma história sem diálogos, como são as memórias que nos contam os avós. E não, não é natural nem óbvio, mas faz sentido. Não voltamos ao princípio. Nunca mais ouvimos falar da Santa e da Pilar e do amigo pintor, mas também não fazem cá falta. Aquele segmento é tão bom e tão bem construído que não sentimos mesmo falta de regressar à vida de faz-de-conta a que tínhamos assistido antes.
Gostei e não gostei de 'Tabu'. E é uma pena porque eu queria muito gostar, mas os bons filmes também são estes, que nos põem a pensar no porque é que gostámos e não gostámos, no que é que percebemos e não percebemos. E nos fazem querer perceber mais.
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