A minha avo Helena
Mais ou menos por alturas do ciclo eu e a minha irmã decidimos ensinar inglês à avó Helena. Quando ela ia passar uns dias lá em casa dávamos-lhe um caderno e obrigávamo-la a repetir My name is Helena, My name is Helena. A minha avó confundia-se um bocado por o “a” se ler “ei” e não conseguia contar mais do que dez mas, mesmo assim, estávamos entusiasmadas. Acordávamos de manhã e corríamos para a cama dela a gritar good morning, the sun is shining. Sem saber, a minha avó foi uma cobaia, a primeira aluna da minha irmã, que hoje é professora de inglês e tem muito mais trabalho a explicar estas mesmas coisas a adolescentes insolentes.
A avó Helena, porque era a avó das férias e dos fins-de-semana, tinha uma paciência infinita. Contava-nos a história da raposa e da cegonha e jogava connosco à bisca e ao burro em pé. Ajudava-nos a fazer vestidos para as bonecas, com choleados e baínhas a preceito. Dava-nos algodão para lançarmos às andorinhas alojadas no beiral. E quando fomos para o liceu era em casa dela que almoçávamos todos os dias. À medida que subíamos ao terceiro andar começávamos a sentir o cheiro da batata doce frita (foi até hoje o único sítio onde comi batata doce frita) e dos bifes com alho. Foi dela que herdei os dedos esguios nas mãos e nos pés, os joanetes e os sinais que me salpicam o corpo até nos locais mais inesperados.
Um dia, a avó saiu de casa e esqueceu-se do almoço no fogo. Noutro dia perdeu a carteira. Noutro começou a perguntar por pessoas mortas. Noutro levámo-la ao médico para confirmar que ela tinha Alzheimer. No dia do funeral, eu e a minha irmã recordámos as aulas de inglês dadas entre os lençóis e imaginámo-la a chegar ao céu, com aquele ar espevitado que sempre tinha, e a dizer ao São Pedro: Hello, My name is Helena. How are you?
A avó Helena, porque era a avó das férias e dos fins-de-semana, tinha uma paciência infinita. Contava-nos a história da raposa e da cegonha e jogava connosco à bisca e ao burro em pé. Ajudava-nos a fazer vestidos para as bonecas, com choleados e baínhas a preceito. Dava-nos algodão para lançarmos às andorinhas alojadas no beiral. E quando fomos para o liceu era em casa dela que almoçávamos todos os dias. À medida que subíamos ao terceiro andar começávamos a sentir o cheiro da batata doce frita (foi até hoje o único sítio onde comi batata doce frita) e dos bifes com alho. Foi dela que herdei os dedos esguios nas mãos e nos pés, os joanetes e os sinais que me salpicam o corpo até nos locais mais inesperados.
Um dia, a avó saiu de casa e esqueceu-se do almoço no fogo. Noutro dia perdeu a carteira. Noutro começou a perguntar por pessoas mortas. Noutro levámo-la ao médico para confirmar que ela tinha Alzheimer. No dia do funeral, eu e a minha irmã recordámos as aulas de inglês dadas entre os lençóis e imaginámo-la a chegar ao céu, com aquele ar espevitado que sempre tinha, e a dizer ao São Pedro: Hello, My name is Helena. How are you?
2 Comments:
Este post tocou-me muito.
:')
Texto bonito :)
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